Assim que o “lockdown” começou a ser adotado, significando o fechamento de todo o comércio considerado não essencial, diversas brincadeiras surgiram nas redes sociais utilizando como tradução o termo religioso “Tranca Rua”. Alguns publicações, porém, foram consideradas como ofensa ao povo da Umbanda.
“Tranca Rua” é o nome de uma entidade espiritual – um Exu – que os adeptos da religião Umbandista acreditam ser o responsável por abrir e fechar caminhos. Segundo uma pesquisa do Instituto Datafolha, pelo menos 2% dos brasileiros tem a Umbanda, Candomblé ou demais religiões afro-brasileiras como crença oficial. Na Bahia, somando essas religiões, são mais de 45 mil adeptos, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
Diante da banalização do termo religioso, a discussão sobre a tradução do lockdown ganhou bandeiras de ‘a favor’, ‘contra’ ou ‘indiferente’ na rede social. A Psicóloga Comportamental pela Pontifícia Universidade Católica (PUC-SP) e umbandista, Samanta Cavalcanti, explica que fazer pouco caso de figuras respeitadas em crenças, além de ser culturalmente errado, é uma porta para fortalecer a intolerância religiosa no Brasil.
“As pessoas que desconhecem as matrizes africanas e seus desdobramentos já possuem um certo receio ao lidar com a realidade dessas crenças, sobretudo ao ouvir a palavra ‘Exu’. A falta de conhecimento religioso provoca o desrespeito e fomenta a intolerância religiosa já presente no país. Ao banalizar termos críveis de uma religião, como no caso do Tranca Rua, estamos assumindo que ela não tem valor em um nação laica”, explica.
Somente no primeiro semestre do ano passado, o número de denúncias de intolerância religiosa subiu cerca de 56%, com predominância nas crenças da matriz africana, seguidas pela religião espírita, de acordo com dados do Disque 100 — Ministério da Mulher, Família e Direitos Humanos.