Psicólogas de BH estão sendo assediadas sexualmente por um homem de 36 anos que as convence a abrir uma videochamada para atender a mãe dele, supostamente, diagnosticada com depressão. Assim que a comunicação em vídeo é aberta, o homem aparece se masturbando. O rapaz, que acumula denúncias da mesma natureza – inclusive presencialmente – desde 2008, admitiu ao BHAZ os crimes sexuais e alegou sofrer de uma espécie de compulsão.

A terapeuta que desencadeou a série de denúncias contra o suspeito tem 23 anos de profissão. Aos 47, ela diz ter sido a primeira vez que sofreu assédio enquanto trabalhava. O episódio ocorreu no dia 13 de janeiro. “Ele me convenceu a fazer uma videochamada e, em determinado momento, percebi que se masturbava enquanto eu passava informações básicas relacionadas ao suposto atendimento para a mãe dele”, conta a vítima.

Outra psicóloga que também atende em BH foi abordada pelo homem há mais de um ano. A mulher relata que o suspeito informou ter encontrado o telefone dela na internet e que queria agendar uma sessão. “Ele ligou umas duas vezes e eu não entendi do que se tratava a princípio, já que a ligação estava ruim. Depois, ele fez uma proposta estranha. Disse que queria se masturbar dentro do consultório e que já havia sido atendido por alguém que deixou. Acredito que seja mentira, ele estava tentando fazer parecer algo aceitável para que eu topasse”, explica a profissional, de 27 anos.

‘Muito estranho’

Uma terceira mulher, também psicóloga em BH, conta que Bruno a procurou com uma história semelhante e que tentou convencê-la a fazer uma videochamada. “Desde o início eu achei ele muito estranho, então não quis dar continuidade. Eu meio que cortei ele, mas passou um tempo e me chamou de novo. Um conhecido meu, da Polícia Militar, me ajudou a localizar informações dele”, diz a terapeuta, que conseguiu uma foto do suspeito. Ela diz não ter informado o caso às autoridades por estar atarefada à época, mas se identificou ao ler o relato da colega.

Em todos os depoimentos, as mulheres ouvidas pela reportagem apontam medo e receio diante dos desdobramentos que envolvem o suspeito. A preocupação é de que ele tenha acesso aos endereços dos consultórios em que elas atendem e de que algo pior possa ocorrer. Por este motivo, elas optaram por vir a público sob anonimato.

A psicóloga responsável pela postagem que denuncia o suspeito diz ter ficado surpresa com a quantidade de mulheres que apareceram com relatos semelhantes. “Eu sinceramente não imaginava que fossem aparecer tantas pessoas. Sabia que podia ter ocorrido com mais alguém, mas a quantidade me surpreendeu. Algumas explicaram que deixaram passar por falta de coragem, de provas ou por pensar que a denúncia não daria em nada”, conta.

A profissional explica ter se sentido afrontada pela atitude do homem e que quis fazer um alerta. “A gente está em um momento de retrocesso, de agressões de todas as formas, enquanto mulher. Pensei em outras pessoas que ele poderia fazer o mesmo, por isso recorri ao grupo”, explica.

Conselho orienta

O CRP-MG (Conselho Regional de Psicologia de Minas Gerais) esclareceu ao BHAZ que apenas um caso foi relatado ao órgão ainda em 2015. A orientação é de que as profissionais sempre busquem as autoridades diante de situações parecidas. O conselho ainda conta com uma Comissão de Mulheres e Gênero para construir orientações e repassá-las às profissionais, além de se colocar à disposição para atender as mulheres da categoria.

Histórico de crimes

Apesar de psicóloga ser um alvo constante de Bruno, as suspeitas de crimes sexuais cometidos por ele não se limitam a esse tipo de profissional. O BHAZ teve acesso a pelo menos cinco registros policiais em que o homem em questão é citado, na maioria das vezes, como suspeito de cometer crimes contra mulheres.

O mais antigo deles é de 2008 e os dois mais recentes de 2018. No primeiro, ele foi denunciado na cidade de Igarapé, na região metropolitana de BH. Na ocasião, a secretária de uma faculdade em que ele era aluno o denunciou por se masturbar e encostar o órgão genital nas costas dela. A mulher acionou uma testemunha e pediu para que ele deixasse o local. O homem fugiu e não foi mais localizado.localizado

Em 2013, o mesmo homem foi denunciado na capital por agredir um funcionário de uma autoescola a socos. Ele teria feito um curso no estabelecimento e voltado ao local para reclamar que os dados dele não foram lançados em um sistema. Bastante nervoso, o suspeito discutiu com mulheres que também trabalhavam no espaço e, depois, partiu para agressão.

Já em maio de 2018, o homem foi denunciado por uma funcionária da Cemig (Companhia Energética de Minas Gerais), em Brumadinho, na Grande BH, por ir ao local de trabalho dela e fazer gestos obscenos. A mulher contou que o fato ocorreu por diversas vezes e que ele chegou a se masturbar diante dela, enquanto a agência estava vazia.

Em setembro do mesmo ano, uma adolescente de 16 anos informou à Polícia Militar, também em Brumadinho, que era perseguida pelo suspeito há cerca de três semanas. No relato, a jovem contou que ele a esperava sempre que voltava da escola, por volta das 11h30, para assediá-la. Em uma das ocasiões, o homem abaixou as calças na frente dela. A denunciante ainda informou ter reconhecido o suspeito por meio de fotos na delegacia da cidade.

Dois meses depois, em novembro de 2018, uma psicóloga procurou as autoridades na capital para denunciá-lo. Ela foi uma das ouvidas pelo BHAZ e, no registro policial, contou que o homem a procurou por duas vezes para atendimento. Na primeira, perguntou se poderia se masturbar no consultório dela e, no segundo contato, enviou um vídeo por meio do WhatsApp em que pode ser visto, aparentemente, cometendo o ato.

Arrependimento

O BHAZ tentou conversar com Bruno, por telefone, em diferentes ocasiões. A princípio, ele negou ser o homem denunciado pelas mulheres. No entanto, voltou atrás e confessou os crimes. Ele ainda associou as abordagens contra as mulheres a condições psicológicas. “O que eu cometi eu parei, isso me prejudica, eu tenho o nome sujo. Isso já prejudicou até minhas filhas. Elas fazem acompanhamento psicológico por isso”, disse.

O suspeito contou à reportagem estar arrependido dos atos e que se apresentaria na Delegacia de Mulheres da capital nessa terça-feira (10), além de dizer que precisa de ajuda. “Eu vou me apresentar em uma delegacia para responder por isso, é um crime na verdade. É muito constrangedor, mas arrependimento não adianta nada. Eu vou resolver isso”, resumiu.

O BHAZ decidiu suspender a publicação desta reportagem para aguardar se a promessa se concretizaria. No entanto, a Polícia Civil informou que Bruno não se apresentou ontem nem mesmo hoje, até às 18h.

“Eu faço acompanhamento e tomo medicamento, relacionamento não tem como ter mais. O remédio corta toda minha vontade, mas a minha ansiedade não tem como, é só eu, eu tenho que masturbar, está entendendo? Não quero defesa de nada, não quero advogado, quero assumir. Eu queria ajuda, eu quero é resolver isso”, argumentou.

Responsabilização

A advogada Isabela Araújo Rodrigues, integrante da Comissão de Mulheres Advogadas da OAB-MG e da rede de enfrentamento à violência contra a mulher, explica que autores de crimes podem ser responsabilizados mesmo que sejam diagnosticados com transtornos mentais que os levem a praticar atos ilícitos.

“O crime vai ser configurado na medida da capacidade de discernimento da pessoa, o que é chamado no Direito de imputabilidade. O que o juiz vai averiguar é se aquela pessoa, no momento do cometimento do crime, podia conduzir suas ações e vontade, qual era o discernimento dela”, conta a defensora.

“Mesmo que o autor argumente possuir algum transtorno mental, existe um processo legal de apuração que definirá isso diante do processo. De toda forma, é preciso observar que as vítimas devem procurar a proteção da lei e fazer as denúncias necessárias. Essa responsabilização só vai ocorrer diante de um processo”, explica a especialista.

Isabela esclarece que o processo contempla um trabalho de perícia para definir a capacidade de discernimento da pessoa, que pode variar entre inimputável e semi-inimputável. De qualquer forma, independentemente da conclusão do laudo pericial, o autor pode receber uma sanção.

“Por meio do laudo pericial é que se decide a aplicação de medida de segurança ou medida de penalização, isso dentro da capacidade de entendimento. Se o sujeito é considerado insano juridicamente, ele vai receber uma medida de internação para um hospital psiquiátrico”, conta.

Denuncie!

O BHAZ também conversou com a delegada Isabella França de Oliveira a respeito dos procedimentos relacionados a vítimas de crimes de natureza sexual. Ela explica que os crimes sexuais não dependem de representação das vítimas, já que são de ação pública incondicionada. “Apesar disso, é imprescindível que as vítimas procurem a delegacia para denunciar a prátia do delito. A vítima pode procurar qualquer Delegacia de Polícia Civil para registrar a ocorrência”, diz.

Na capital mineira, o endereço mais indicado é a Delegacia Especializada de Investigação a Violência Sexual, localizada na avenida Barbacena, no número 288, no Barro Preto, região Central da cidade.

Ainda de acordo com a delegada, uma investigação pode contemplar vários casos quando envolve o mesmo suspeito. “A delegada que estiver apurando as denúncias vai decidir pelo andamento do procedimento, ela pode instaurar inquéritos distintos ou apurar tudo em um mesmo inquérito”, explica.

Em casos de crimes cometidos por meio da internet, ou das redes sociais, é a delegada também quem analisa e decide a respeito de uma possível qualificação do crime de importunação sexual. A pena para quem envia cena de sexo, nudez, ou pornografia, sem o consentimento da vítima pode variar de 1 a 5 anos de prisão, caso o fato não constitua crime mais grave.

Por fim, a delegada orienta que, em casos de violência com conjunção carnal, a vítima deve antes procurar atendimento médico e, na sequência, informar o caso às autoridades em uma delegacia mais próxima. “Em caso de importunação sexual, a pessoa deve acionar a Polícia Militar para um primeiro atendimento ou procurar uma Delegacia de Polícia Civil, para registrar a ocorrência e possibilitar a atuação imediata da polícia”, conta.

Importunação sexual x estupro

O crime de importunação sexual se tornou lei em 2018 e é caracterizado pela realização de ato libidinoso na presença de alguém e sem sua anuência. O caso mais comum é o assédio sofrido por mulheres em meios de transporte coletivo, como ônibus e metrô. Antes, isso era considerado apenas uma contravenção penal, com pena de multa. Agora, quem praticá-lo poderá pegar de 1 a 5 anos de prisão.

Já o crime de estupro é previsto no art. 213, e consiste em “constranger alguém, mediante violência ou grave ameaça, a ter conjunção carnal ou a praticar ou permitir que com ele se pratique outro ato libidinoso”. Mesmo que não exista a conjunção carnal, o criminoso pode ser condenado a uma pena de reclusão de 6 a 10 anos. O art. 217A prevê crime de estupro de vulnerável quando a vítima tem menos de 14 anos ou possui algum tipo de vulnerabilidade, e a pena varia de 8 a 15 anos.