Na Bahia, ao menos 14 facções criminosas disputam o controle do tráfico de drogas, e essa luta pelo poder atinge os baianos de forma sutil – mas perigosa. Gestos com as mãos, escolhas de roupas e até mesmo palavras podem ter ‘dono’, colocando em risco pessoas sem ligação com os crimes. O trágico assassinato dos irmãos Daniel Natividade, de 24 anos, e Gustavo Natividade, de 15, percussionistas do bloco afro Malê Debalê, trouxe à tona uma questão: quando sinais inocentes podem colocar vidas em risco na Bahia?

Durante um passeio em Arembepe, na cidade de Camaçari, os jovens foram mortos por traficantes do Comando Vermelho (CV), após serem vistos em uma foto fazendo o gesto de ‘3’ com os dedos. Na linguagem das facções, esse sinal é associado ao Bonde do Maluco (BDM), grupo rival do CV. Embora o gesto não tenha sido feito de forma intencional, os traficantes interpretaram como uma afiliação ao BDM, levando à execução dos irmãos.

Esse caso evidencia como sinais aparentemente inofensivos podem ser mal interpretados em áreas dominadas por quadrilhas. Em alguns territórios, os limites entre o cotidiano e o poder das facções são tão tênues que um simples movimento pode custar vidas.

SÍMBOLOS E SINAIS

Os gestos com as mãos são uma das formas mais comuns de identificação entre membros de facções criminosas. O sinal de ‘3’, por exemplo, é amplamente associado ao Bonde do Maluco (BDM), enquanto o Comando Vermelho (CV) usa o símbolo ‘CV’ com os dedos para identificar seus integrantes e simpatizantes, além do tradicional ‘Tudo 2’ ou a foice, martelo, e o vermelho.

Esses sinais, que a princípio podem parecer alusões ao símbolo de ‘paz e amor’ ou até movimentos políticos como comunismo, agora carregam um significado mais perigoso, sendo interpretados como demonstrações de lealdade ou associação a grupos criminosos.

Além do BDM, considerada a maior organização criminosa da Bahia, atuante em Salvador e na Região Metropolitana (RMS), e da facção carioca Comando Vermelho, a capital baiana abriga outras quatro facções: Katiara, Comando da Paz (CP), Ordem e Progresso (OP), e Terceiro Comando Puro (TCP).

Os modos de identificação das quadrilhas não se limitam apenas aos gestos. A facção Katiara, por exemplo, originária do Recôncavo Baiano e hoje com domínio em bairros estratégicos como Lobato, Valéria e Águas Claras — áreas de influência devido à proximidade com a BR-324 — utiliza tatuagens para marcar seus membros.

O símbolo comum é um pentagrama, acompanhado da sigla PCRFNK (Primeiro Comando Recôncavo Facção Nazaré Katiara), de acordo com Alden José Lázaro da Silva, especialista em análise criminal e autor da cartilha “Linguagens Simbólicas do Crime”, que detalha as facções atuantes na Bahia.

A Katiara também utiliza o número 5 para fazer menção ao pentagrama. Então, em determinados limites de Salvador, um simples aceno com as mãos pode ter consequências.