“Não tenho preparo emocional para vivenciar isso. Foi muito assustador. A gente de madrugada, no escuro. O barulho do rio, que estava muito alto. Um medo de morrer de noite, no escuro, sem saber para onde a gente estava indo”.

O relato desesperador é da empresária Luciana Cavalcante. Naturais de Salvador, ela, o marido e as três filhas buscaram a tranquilidade da cidade de Laje, a 235 km na capital, para abrir o próprio negócio: uma ótica.

Uma quinzena antes do Natal, a família teve o primeiro impacto com a cheia do Rio Jequiriçá. Morando em uma localidade ribeirinha, Luciana tentou evitar a tragédia, mas a força do rio foi maior.

“A primeira enchente foi 15 dias antes do natal. Nossa casa foi invadida, perdemos algumas coisas, mas nada grave. Só que a gente não esperava que depois do Natal voltasse a encher tanto. Fizemos contenções, botamos coisas para o alto, mas a água subiu muito rápido e não deu tempo de tirar tudo”, destacou ela.

Na madrugada do último domingo (26), a casa desmoronou. Luciana e a família assistiram a cena na casa de vizinhos, a cerca de três metros da residência. Apesar da perda material, ninguém ficou ferido.

“Não tinha ninguém dentro de casa, graças a Deus. Nós ficamos na casa de vizinhos, vimos tudo a três metros de distância. Viemos para Laje, para abrir uma ótica, começar uma nova vida, e vimos nossa casa ser levada assim. Trouxemos tudo de Salvador, fogão, geladeira, micro-ondas, roupas. Perdi todos os meus livros, eu adoro ler. A água levou tudo, até o botijão de gás”, pontuou.

“É uma situação que eu nem sei dizer o que estou sentindo. Tem horas que parece que eu estou bem, depois eu choro, fico preocupada”.

O comércio da família, assim como o de outros empresários, não chegou a ser afetado pela chuva, por causa da localização.

“O comércio não alagou porque o prefeito fez um reforma de escoamento de água um ano antes, mas toda a zona rural foi devastada. Mesmo assim, o comércio tá parado, porque as pessoas estão sem condições de abrir. Até a gente se restabelecer, vai demorar um pouco”.

“Na cidade, por exemplo, não tem mais casa para alugar. Não tem nem como buscar um outro lugar para ficar. Estamos na casa de amigos e ainda não sabemos como será feita a ajuda para as pessoas”.

A família se cadastrou no programa assistencial da cidade. Para Luciana, o próximo ano será de recomeçar a nova vida. Amigos criaram uma vaquinha virtual, para arrecadar R$ 15 mil para construir uma nova casa. Nesta quarta-feira (28), a meta já havia sido atingida.

“Por mais que a gente visualize a situação, viver é muito pior. Meu desejo agora é lutar, para que a gente não desista e tenha que voltar para Salvador. Só sei que para lá, perto do rio, eu não volto mais”.

Cidades em situação de emergência
Laje é um dos 136 municípios baianos que estão em situação de emergência, por causa das fortes chuvas que caem na Bahia desde o mês de novembro. Ao todo, 471.786 pessoas foram afetadas pela chuva, e 21 morreram.

O número de desabrigados – que são as pessoas que perderam seus imóveis e precisam de apoio do poder público – está em 34.163. Já o total de desalojados – que são as pessoas que também perderam os imóveis, mas foram alocadas em casas de familiares – está em 42.929.

G1 Bahia.