Tem dono que não economiza dinheiro nem disposição para cuidar do próprio carro. É verdade que seguir à risca o plano de manutenções recomendado no manual do veículo prolonga a vida útil de componentes. Além disso, evita o agravamento de problemas cujo reparo, ali adiante, elevaria – e muito – a conta na oficina.
Contudo, como dizem, todo excesso faz mal, e o ditado também vale para automóveis. Com a (boa) intenção de preservar o patrimônio, há proprietários que exageram no carinho, fazendo eles mesmos ou contratando serviços desnecessários.
Além do desperdício de tempo e dinheiro, há práticas cujo efeito é o oposto do desejado e trazem danos ao amado veículo.
Confira cinco exemplos clássicos que não deixam dúvida: é preciso cuidar, mas do jeito certo.
1 – Polimento da pintura tem limite
Não há problema algum em lavar o carro nos fins de semana e passar aquela cera caprichada na pintura, desde que o veículo esteja na sombra, para prevenir o aparecimento de manchas.
Também é fundamental usar produtos adequados para esse tipo de cuidado, incluindo esponja e pano de microfibra.
Muitos recorrem ao polimento para devolver o brilho à pintura, especialmente em carros mais antigos e rodados.
O resultado chega a impressionar, a ponto de pessoas fazerem elas mesmas o serviço na garagem de casa, utilizando uma máquina politriz.
Porém, mesmo se você tiver o conhecimento técnico, saiba que polir a pintura não é algo para se fazer com frequência.
“Polimento é uma ação retificadora, para uniformizar, recuperar o brilho e remover imperfeições. Como remove parte da camada de verniz, ele tem um limite. Existem carros que não toleram mais que três polimentos”, alerta Antônio Carlos Cosimato, da Deep Cleaning, empresa especializada em detalhamento automotivo.
2 – Colocar aditivo no óleo ou no combustível
Esse serviço, muitas vezes ofertado em postos de combustível com a promessa de “limpar” o motor e melhorar o consumo e o desempenho, é desnecessário e em alguns casos pode até causar danos, alerta Francisco Satkunas, conselheiro da SAE Brasil.
“Tanto o combustível quanto o óleo lubrificante já são certificados e vendidos com a formulação necessária para proporcionar o funcionamento ideal do motor”, afirma.
O engenheiro lembra que, se o cliente fizer questão de um produto para prevenir o acúmulo de sujeira e de resíduos nos componentes internos, os postos já oferecem variantes aditivadas de gasolina e etanol.
“Não recomendo colocar aditivo”, orienta.
3 – Limpeza ‘preventiva’ dos bicos injetores
“Hoje não está prevista a limpeza de bicos injetores no plano de manutenção, ao menos nos manuais que eu já consultei. Desconheço montadoras que recomendam a prática ao atingir determinada quilometragem”, afirma Erwin Franieck, mentor em engenharia avançada da SAE Brasil.
Franieck diz que nunca solicitou o serviço e até hoje nenhum dos veículos que já teve necessitou do serviço.
“Essa cultura vem do tempo do tempo do carburador, quando era preciso remover o depósito de resíduos que se formava. Com a melhora na qualidade do combustível, o surgimento da injeção eletrônica e a evolução dessa tecnologia, a limpeza em intervalos regulares já não é obrigatória “, pontua.
Para o especialista, essa intervenção deve ser realizada apenas quando o motor apresenta falha de funcionamento comprovadamente causada por bico entupido.
“Tem de avaliar caso a caso. O sensor de oxigênio, a popular sonda lambda, pode identificar redução na vazão em um ou mais bicos injetores. Porém, o problema pode estar relacionado a outros componentes, como filtro obstruído e falha na bomba de combustível”, explica.
4 – Encher tanque até a boca para evitar pane seca
O manual do proprietário deixa bem claro: rodar com o tanque constantemente na reserva não é benéfico para o carro, pois, além de trazer risco de pane seca, que pode causar danos mecânicos e rende multa de trânsito. O consumo também sobe nessa situação.
“O tanque quase vazio significa mais espaço para vaporização do combustível. A taxa de perda por evaporação, portanto, sobe”, explica o engenheiro Everton Lopes.
Para evitar o problema, há motoristas que preferem encher o tanque o máximo possível, até quase transbordar – ainda mais em tempos de reajustes sucessivos dos combustíveis. Contudo, a estratégia igualmente não é recomendada e quem sofre com isso é o carro.
“Encher o tanque até o bocal danifica o cânister, que é filtro com carvão ativado responsável por reter os gases provenientes da evaporação do combustível. Esse filtro, geralmente localizado próximo ao tanque, é encharcado, perdendo toda sua eficiência”, alerta Lopes.
De acordo com o engenheiro, os vapores que emanam do tanque são altamente tóxicos e poluentes – daí a importância de se manter o cânister em bom estado.
A orientação do especialista é parar o abastecimento assim que gatilho for desarmado – o que proporciona nível adequado e seguro.
5 – Descarbonização do motor
A limpeza química da parte interna de motores, conhecida como “flush”, é um serviço que promete melhorar o consumo e também a performance.
A técnica utiliza produtos que podem ser adicionados diretamente no tanque ou no cárter, com o objetivo de remover a carbonização naturalmente causada pela queima do combustível e do lubrificante consumido no processo.
Segundo Everton Lopes, a prática pode causar danos no lugar de benefícios – especialmente em veículos bastante rodados e que não costumam ser abastecidos com combustível aditivado.
Segundo ele, o “flush” é capaz de danificar componentes internos, como bronzinas, anéis e camisa do pistão, trazendo risco até de travamento do propulsor – o que exigiria uma retífica.
“Não recomendo, sobretudo se o motor apresentar alta quilometragem e maior consumo de óleo, por conta do desgaste natural dos componentes internos, com formação de borra”, avalia.
Segundo o especialista, o ideal, nesse caso, é desmontar o propulsor e efetuar limpeza mecânica com escova e produto específico, de forma a retirar todos os resíduos antes de montá-lo novamente e colocá-lo para funcionar.
Lopes explica por que a limpeza química pode ser bastante nociva – ainda mais se não for acompanhada em seguida da troca do óleo lubrificante.
“Quando você realiza um procedimento como esse, a carbonização e outros resíduos que se desprendem das válvulas de admissão e escape e dos pistões costumam contaminar o óleo. Especialmente o carvão traz partículas sólidas que, se ingressarem no circuito de lubrificação, causam riscos, trazendo a possibilidade até de o propulsor engripar e parar de funcionar”.